terça-feira, 24 de novembro de 2009

No fundo do mar


Como dizer por palavras cada vez que sentimos que o mundo se revolve dentro de nós.
A gravidade da terra suga-nos para dentro, e ficamos sem saber o que encontrar e como sair. Pudessemos sempre acreditar e sonhar que é possível, que o que importa é o que somos, os consequentes actos e que a esperança é a última a morrer.

Criam-se metas, rotas e fazem-se caminhos a partir do que se vive e do que se tenta acreditar. Mapas que se vão delineando como as palmas das nossas mãos, com marcas fundas e profundas mas que se vão deformando ténuamente, assim como alguém que é embalado para dormir, como os bébés... Dorme, dorme entra num sonho profundo descansa quando acordares, talvez a história já seja outra, talvez diferam as cores...

Um dia o despertar pode ser tão radical, como se o mundo estivesse de pernas para o ar, ou de repente tudo esteja em slow motion, até parecer tudo paralizado... Podendo ficar entre a respiração e os ruídos, entre a atmosfera e os cenários. Também o lado pictórico da vida capta por vezes os nossos sentidos, quando se misturam os sentimentos com as sensações. Como se nos encontrassemos ou nos perdessemos num mundo colorido e nós ficámos baços de cinzento, ou num mundo a preto e branco, surgindo alguns pontos luminosos que despertam a atenção... Quando o real parece sonho ou a realidade nunca deixou de ser surrelista... Entre o banal e o bizarro, os simples gestos que nos tornam humanos ou animais...

Caminhar entre a multidão, vivendo num pulsar do passo de todos e de ninguém, cada um segue solitário o seu caminho, cruzando olhares, caras, cheiros e gestos... A vida da cidade, talvez surja uma palavra, uma conversa ou um conflicto, talvez se retenha na memória, ou se perca em mais uma das mil imagens diárias que nos entram desavergonhadamente na nossa cabeça e que permanacem ou desaparecem como fumo...
Saber estar, falar e viver em sociedade, sobreviver e sonhar pode parecer uma quimera que oscila entre o pesadelo e o melhor sonho das nossas vidas...

Vamos ao som de tic tac, ti tac, tic tac... Assim sem parar, há energia, há saúde, cabeça e pernas para andar, para criar e para acreditar, seguimos, lutámos e continuamos... Tic tac, tic tac... Há contas de matemática que não deveriam existir! O tempo, como uma entidade apenas a ser relevada quando tivesse significado, quando o processo de algo traz algo eterno ou perdurável, com uma utilidade ou importância vital... Por exemplo, a duração de uma relação sexual, a gestação de um embrião até ao parto, a cura da carência de sentimentos, o crescimento da semente até planta ou árvore, até o leite ser manteiga ou queijo, até se conseguir pescar um peixe, escrever o melhor livro das nossas vidas, até o vinho ser realmente bom, até uma criança aprender a andar e a falar, até todos conseguirem pedir desculpa ou voltarem atrás, ou um passo ao lado como o caranguejo...
Até descobrirmos o nosso eu ou estarmos em paz com o mesmo, até pararmos de sonhar, até a água ferver, o elevador chegar, a confiança em alguém brotar, até um homem se corromper, até perdemos os cabelos e os dentes e até a morte chegar... Parem os relógios, a sintonia da vida tem o seu ritmo próprio, cada qual com a sua melodia e o seu pulsar...

Fecho os olhos e imagino-me dentro do mar flutuando como se voasse entre os peixes e aprendo a escutar a sua música, vejo então como tudo pode ser simples... Basta observar e deixar-nos mergulhar na dimensão da cada lugar, cada momento, cada pessoa e circunstância e fechar sempre os olhos e escutar o fundo do mar...

Voltemos o tempo atrás, qual sería o nosso papel noutra época, que protagonismo teríamos?! Hipóteses vagas, num tempo onde ainda existia menos lugar para as pessoas, agora podemos representar vários papeis e sobreviver como actores de rua, evitando cada conflicto, aprendendo a cada dia encarando de frente a precaridade do que existe, pois amanhã a história pode ser outra... Na boa viela somos tudo e não somos nada, mas é preciso muito, muito para esquecermo-nos de nós, do que foi e do que pode ainda ser!
Continuando, tirando as máscaras, fechando os olhos estamos no fundo do mar, todos a sorrir.

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